
Crianças indígenas da etnia Avá-Guarani, que vivem no oeste do Paraná, pararam de ir de à escola após constantes ameaças e violências registradas na região, alvo de conflitos históricos.
A situação, identificada pelo Ministério Público do Paraná (MP-PR), se agravou após o indígena Everton Lopes Rodrigues, de 21 anos, ser encontrado decapitado em julho deste ano. Na ocasião, uma carta junto ao corpo fez ameaças às comunidades, em especial às crianças e adolescentes que utilizam ônibus escolares.
Segundo o MP, o documento dizia: “[…] nós vamos matar mais de vocês, iremos invadir as aldeias já existentes, atacaremos os ônibus com as vossas crianças dentro, queimaremos vivos. Não é uma ameaça vazia, mas, sim, recheada com ódio.”
O bilhete também pedia que as comunidades interrompessem processos de retomada de terras. Um acordo da Itaipu, homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que trata da compra de terras para indígenas na região.
O número exato de crianças que têm faltado à escola não foi divulgado, mas o MP afirmou que o problema afeta as comunidades de Guaíra, um dos cinco municípios que compreendem as Terras Indígenas (TIs) Tekoha Guasu Guavirá e Tekoha Guasu Okoy Jakutinga. Mais de 500 crianças, entre 2 e 12 anos, vivem no local.
Segundo o MP-PR, a ameaça na carta gerou pânico entre famílias indígenas. O órgão afirma que algumas só permitiram o retorno das crianças aos estudos depois de intervenção do MP.
“No último assassinato foi deixado um bilhete onde o alvo são as crianças que estudam nas escolas públicas das cidades. Na carta, eles disseram para nós recuarmos, se isso não acontecesse iriam queimar ônibus escolar com nossas crianças dentro. Sabemos que eles realmente podem fazer isso, porque existem dois ônibus escolares apenas com estudantes indígenas”, afirmou Vilma Rios, liderança Avá-Guarani.
A advogada Ana Caroline Silva Magnoni, da Comissão Guarani Yvurupa, relatou que ameaças constantes têm provocado traumas profundos.
“Recebemos relatos de crianças que não conseguem dormir e têm medo de ir à escola. Além das ameaças no transporte, muitas também enfrentam racismo e hostilidade dentro das próprias instituições de ensino. Isso causa evasão escolar, afeta a saúde mental e pode até gerar cortes no Bolsa Família, já que a frequência é exigida”, explicou.
Escolas e evasão
Em Terra Roxa, município que abriga parte do território indígena, a Secretaria Municipal de Educação informou que 48 crianças indígenas estão matriculadas em duas escolas da cidade. A pasta confirmou que houveram ocasiões em que os alunos deixaram de embarcar nos ônibus, mas afirmou que os veículos continuaram cumprindo os trajetos normalmente.
Em Guaíra, a Secretaria Municipal de Educação informou que 260 crianças indígenas estão matriculadas em 25 instituições de ensino da cidade.
Segundo a Comissão Guarani Yvurupa, embora exista o Colégio Estadual Indígena Arandu Guarani, em Terra Roxa, e a Escola Estadual Indígena Mbyja Porã, em Guaíra, elas não comportam todas as crianças das aldeias.
“A maioria precisa frequentar instituições não indígenas em áreas urbanas, o que aumenta o risco durante os deslocamentos. A principal demanda das comunidades é a instalação de escolas dentro das aldeias”, reforça Magnoni.
O g1 questionou a Secretaria de Educação do Estado do Paraná (Seed-PR) sobre número de indígenas matriculados na rede estadual, a pasta afirmou que conta com 40 escolas exclusivamente indígenas, que atendem aproximadamente 5,5 mil estudantes das etnias Kaingang, Guarani, Xokleng e Xetá.
Acrescentou ainda que, em relação à recomendação da região oeste, trabalha diuturnamente para garantir a segurança e o respeito aos alunos e tratará do assunto diretamente com o Ministério Público.
Em acordo com STF, a Itaipu Binacional ficou responsável, além da compra de terras para as comunidades, a proporcionar benfeitorias a partir de diagnóstico da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), considerando as demandas a partir do Plano de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA).
Segundo a Itaipu, as demandas educacionais serão levadas em conta em parceria com as prefeituras e governo estadual.
Via G1